Na abertura da 49ª Sessão Extraordinária da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CorteIDH), na tarde desta segunda-feira (11), o presidente da instituição, Diego Garcia-Sayán, o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Joaquim Barbosa, e o ministro de Estado da Justiça, José Eduardo Cardozo, ressaltaram a importância da realização desta sessão no Brasil, no sentido da compreensão do papel da CorteIDH no sistema interamericano de direitos humanos. A sessão solene, realizada no Plenário do STF, em Brasília, contou com a presença dos integrantes da CorteIDH, de ministros do STF e de autoridades brasileiras. O ministro Joaquim Barbosa afirmou que o Brasil se sente honrado em acolher a sessão extraordinária, que, segundo ele, “está imbuída de marca histórica”. 
 
A cerimônia foi acompanhada também por parentes das vítimas colombianas do processo que será examinado pela CorteIDH a partir de amanhã (12) – caso Rodríguez Vera e outros versus Colômbia, que trata de desaparecidos na tomada do Palácio de Justiça da Colômbia por forças militares em 1985. A operação militar se deu em resposta à ação do Movimento 19 de Abril (M-19), que ocupou o prédio, sede da Suprema Corte da Colômbia, na tentativa de levar a julgamento o então presidente colombiano, Belisario Betancur.
 
Direitos humanos e a redemocratização brasileira
 
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, apresentou mensagem da presidente da República Dilma Rousseff, na qual salientou que a relação do Brasil com o sistema interamericano de direitos humanos confunde-se com o próprio processo de redemocratização do país. Ela rememorou os 25 anos da Constituição Federal brasileira, “reconhecidamente um divisor de águas a partir do qual o Brasil passou a atualizar seus compromissos internacionais no campo dos direitos humanos”. Segundo a presidente, “é de fundamental importância que a sociedade brasileira e que todos os órgãos, de todos os poderes, de todas as esferas, entendam o valor do trabalho realizado pela Corte, bem como o sentido dos compromissos assumidos pelo Brasil frente a essa instância”.
 
Respeito aos direitos humanos
 
Em seu discurso, o presidente do Supremo lembrou que no dia 9 de julho de 1992 o Brasil ratificou a Convenção Americana sobre Direitos Humanos. “Passados 21 anos, a mesma essência do que se convencionou naquela época perpetua-se no Supremo”, afirmou. “A recepção da Corte Interamericana pelo Supremo reafirma o respeito dessa Corte aos valores inerentes aos direitos essenciais do homem, já reconhecidos e explicitamente declarados no Pacto de San José da Costa Rica”.
 
De acordo com o ministro Joaquim Barbosa, os primeiros passos dos Estados americanos foram no sentido da proteção dos direitos humanos, ainda diante da “triste memória” da Segunda Guerra Mundial. “Era necessário então dotar os cidadãos de meios que permitissem uma efetiva resistência a todo e qualquer regime totalitário”, afirmou. “Hoje percebemos uma verdadeira busca de efetividade do sistema interamericano de direitos humanos, e é com grande satisfação que o Supremo compartilha dessa visão que, de maneira ampla, forma a estrutura básica de condições para uma vida digna e plena”.
 
Para o presidente do STF, o diálogo entre os poderes públicos e os organismos internacionais é ferramenta relevante de concretização dos ideais republicanos. “A nítida compreensão da existência de uma esfera de jurisdição atribuída pelo Brasil e vários outros países latino-americanos a órgãos do sistema interamericano de direitos humanos faz dessas entidades internacionais órgãos integrantes da rede de atribuições jurisdicionais a que o nosso país soberanamente decidiu se submeter”, salientou. “Não estamos aqui recepcionando uma Corte estrangeira, mas um órgão que, de fato, integra o conjunto de instituições acreditadas pelo Brasil para a atuação na defesa e no fomento dos direitos humanos”.
 
Temas analisados no STF
 
Ao longo dos últimos anos, conforme o ministro, diversos temas que integram a jurisprudência já consolidada da CorteIDH foram abordados no Supremo. Entre eles, processos relacionados ao tempo oportuno de duração do processo judicial, ao prazo razoável da prisão cautelar, à validade da criação de conselhos de Justiça no âmbito da Justiça Militar, à compreensão do princípio da não incriminação do réu, ao não cabimento da prisão civil do depositário infiel, à existência de tipo penal quanto aos casos de tortura contra crianças e adolescentes, além de vários argumentos relacionados à Convenção Americana sobre Direitos Humanos adotados pelo STF no indeferimento de alguns pedidos de extradições.
 
“O Brasil vem assumindo duradouros compromissos com as decisões tomadas na esfera internacional dos direitos humanos”, destacou, ao dar como exemplo a inclusão do parágrafo 3º do artigo 5º da Constituição Federal pela Emenda Constitucional 45. Com isso, a Corte possibilitou o reconhecimento da equivalência de tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos às Emendas Constitucionais, o que “demonstra a inequívoca abertura do Brasil às inovações relacionadas à defesa e à promoção dos direitos do ser humano”.
 
Ao final, o ministro Joaquim Barbosa salientou que a realização da sessão da CorteIDH no Brasil e sua parceria com o STF demonstram “a verdadeira intenção do Judiciário Brasileiro” de melhor compreender o sistema interamericano de direitos humanos. “O presente encontro, além de fortalecer os laços, também realça a importância atribuída pelo Poder Judiciário brasileiro à atuação da CorteIDH”, concluiu.
 
Desenvolvimento da CorteIDH
 
“Tem um significado muito forte sermos recebidos dessa maneira pela justiça brasileira. Confesso que esse é um ato sem precedentes e estamos muito honrados de estarmos aqui nessa Casa”, disse o presidente da CorteIDH Diego Garcia-Sayán, ao agradecer a recepção generosa, pelas autoridades brasileiras, do 49º Período Extraordinário de Sessões da Corte Interamericana. Segundo ele, o objetivo da realização de sessões no Brasil é fazer com que o povo, um dos destinatários de suas decisões, conheça como a Corte funciona.
 
Garcia-Sayán falou sobre alguns assuntos julgados pela Corte, como liberdade de expressão, anistia, acesso à informação, questões indígenas e atenção aos direitos das vítimas. Para Sayán, esses temas enriquecem as democracias dos países e o direito internacional. Quanto à liberdade de expressão, afirmou que este direito, “muito maltratado durante os anos pelo autoritarismo e pela ditadura”, é matéria constantemente analisada pela CorteIDH, que tem produzido jurisprudência para a proteção dessa garantia tanto para a imprensa como para qualquer cidadão.
 
No entanto, ressaltou a necessidade de ponderação e equilíbrio entre os direitos quando houver possíveis conflitos. “A liberdade de expressão não pode ser entendida como um direito que se exerce sem limite”, afirmou. “Tem que se levar em conta outros direitos, como aqueles relacionados à honra e à intimidade”.
 
De acordo com Garcia-Sayán, a jurisprudência da CorteIDH tem sido variada, uma vez que as pessoas passaram a ter maior consciência de que podem exercer seus direitos. “Aumentaram os casos perante a Corte”, assinalou. “Agora, a população tem mais conhecimento e aciona a CorteIDH, que finalmente não está tão longe da sociedade como se pode imaginar”. Segundo seu presidente, “a CorteIDH tem beneficiado e se beneficia de um contexto em que a marcha democrática avança graças a povos e autoridades que estão dando os passos necessários para ir nessa direção”.
 
Fonte: STF.